Entre eles, há os que nenhum ser
humano pode ser privado, que são inerentes a simples condição humana, como a
vida e dignidade.
Para melhor compreensão da sua dimensão, os direitos humanos
podem ser assim classificados:
- Os de 1ª geração, que dizem respeito fundamentalmente à liberdade e à participação na vida civil, e de limitação do poder do Estado;
- Os de 2ª geração a igualdade de oportunidades económicas, sociais e culturais, sendo dever do Estado de respeitá-los, promovê-los e cumpri-los. Entre outros, temos o direito a condições justas e favoráveis ao trabalho e proteção do emprego, direitos à alimentação, moradia, educação, saúde e segurança;
- Temos ainda os direitos humanos de 3ª geração, que se baseiam em valores de fraternidade e solidariedade, que tem relação, por exemplo, com direitos à qualidade de vida e à preservação do meio ambiente, limitando iniciativas privadas e estatais;
- Existem ainda debates na doutrina sobre uma classificação de direitos humanos de 4ª geração, como o direito à democracia, e os de 5ª geração, como o direito à paz.
Partindo destas compreensões identificamos o poder e os limites
de atuação do Estado Democrático de Direito, como forma de organização da
sociedade que visa a concretização destes direitos.
Nessa atuação, no entanto, os caminhos que são percorridos entre
a garantia da ordem, da paz social e da segurança, e a eventual violação dos
direitos humanos, são bastante estreitos.
Para assegurar os direitos humanos de todos, são estabelecidas
sanções a que são submetidos os indivíduos que ofendem os direitos dos outros, inserindo-se
aí, mas não exclusivamente, o direito penal.
As penas surgem assim, também como uma ferramenta pedagógica
do Estado, para que aqueles que violam as leis compreendam e internalizem os
valores sobre as quais elas se sustentam, de forma a viabilizar sua reinserção plena
na vida em sociedade.
Neste sentido, a imposição de uma pena privativa de
liberdade legitima-se não só como uma forma de promover e assegurar ordem e a paz
social, mas também de oportunizar a reabilitação de quem enveredou por caminhos
à margem destas balizas.
A ideia de ressocialização liga-se, assim, a preceitos correcionalistas, visando o retorno gradual do detento ao convívio social.
Para tal, o sistema carcerário organiza-se como um aparelho
disciplinar, que em tese, visaria deter o indivíduo em conflito com a lei, sem
desatender à vontade da sociedade civil de ver o detento resgatado do mundo do
crime.
A própria Lei de Execuções Penais apresenta entre seus objetivos
primordiais, não só assegurar a efetividade das decisões judiciais, mas também proporcionar
condições para a harmônica integração social e para a assistência dos segregados.
Ela visa, em última instancia, reintegrá-los à vida em
liberdade e prevenir a reiteração de crimes, orientando seu retorno à
convivência em sociedade.
Dentre as ferramentas previstas para atingir essa meta, temos a
educação, o trabalho e as intervenções médicas e psíquicas, em um processo de aprendizagem e de interiorização de valores.
Como se vê, a prisão não se apresentaria, portanto, como um
instrumento de vingança, mas sim um meio de reinserção humanitária do indivíduo
na sociedade.
Contudo, o universo prisional revela-se essencialmente repressivo,
baseado não só na disciplina, mas também na violência, na medida em que os
presos são muitas vezes submetidos a um regime de privação total.
Um exemplo disso é que a LEP prevê que deveria ser reservado
a cada preso do sistema penitenciário um espaço de seis metros quadrados, sendo
que na realidade há condenados cumprindo pena em espaços com menos de um metro
quadrado.
Não por outra razão, percebemos na maioria das vezes o
fracasso das nossas instituições na missão de transformar o delinquente em um
cidadão capaz de voltar a ter o respeito e a dignidade, e para ser novamente considerado
pela sociedade como um ser humano.
A distância entre a realidade prisional e o ideal de reinserção
do detido, com base em uma técnica pedagógica de estímulo da sua
individualidade, de respeito aos outros, do autorrespeito, e da espontaneidade,
é muitas vezes devastadora.
O choque de realidade é ainda mais duro para o egresso do
sistema, que deixa a condição de segregado, mas mantém seu status de
marginalizado.
E é da natureza desta relação de quem exclui (a sociedade), com
o excluído (o ex-detento), que vem a importância da chamada reabilitação
criminal: o benefício que restitui ao condenado o direito de ter sua ficha de
antecedentes criminais apagada após o cumprimento de sua pena.
Trata-se de um direito relacionado à própria dignidade
humana, visando a efetividade da função social de ressocialização e do direito a
reinserção em sociedade.
Pela complexidade destes temas revelam-se temerárias as
respostas simplistas e os discursos fáceis, de quem olha para esta problemática
de forma preconceituosa e negacionista.
Fechar os olhos para estas questões também não resolve esse
problema, que se retroalimenta justamente pela inércia daqueles que deveriam enfrentá-lo
em sua real dimensão.
Cabe a cada um de nós deslocar o nosso lugar de fala, da
posição de meras vítimas da violência e da criminalidade, e nos posicionarmos
de forma consciente, como integrantes de uma sociedade que se pretende justa e
solidária.
O Podcast Conversando Direito ⚖️ com Fabiana Barcellos Gomes está disponível no Spotify (https://spoti.fi/33G7ZY4), no Deezer (https://bit.ly/2syt0ab), no SoundCloud (https://soundcloud.com/barcellos-gomes-advocacia), e em outras plataformas digitais. Também pode ser acessado diretamente no site (https://barcellosgomes.adv.br) e no YouTube(http://youtube.com/c/BarcellosgomesAdvBr):