Em abril de 2017 foi instalada no Senado Federal a “CPI dos Maus Tratos” com o intuito de apurar diversas formas de violência contra crianças e adolescentes.
Durante os trabalhos daquela CPI foram realizadas diversas audiências públicas, com a participação de autoridades e especialistas, bem como na investigação de crimes dessa natureza e na responsabilização dos agressores.
Durante estas audiências os participantes expuseram os riscos aos quais crianças e adolescentes estão expostos, e foram discutidos problemas no atendimento às vítimas de brutalidade, de maus-tratos, de abusos e de agressões.
Também foram ouvidos relatos de mães, pais, avôs e avós sobre investigações de abusos contra seus filhos e netos, sendo a alienação parental um tema recorrente em muitos desses relatos.
Nas investigações realizadas pela CPI foram identificados indícios de que supostos abusadores estariam usando brechas legais da Lei da Alienação Parental, inclusive para obter a guarda das próprias crianças contra quem estariam sendo acusados de cometer crimes.
O fenômeno da alienação parental é bastante conhecido e envolve condutas como a desqualificação de um genitor perante a criança, sabotagens da autoridade parental ou da relação entre pais e filhos.
Evidencia-se também pela imposição de dificuldades ou empecilhos no contato da criança com um genitor ou até mesmo a manipulação da criança para que rejeite o outro genitor.
Entretanto, ao longo dos trabalhos da CPI, houve relatos de casos nos quais genitores acusados de cometer abusos ou outras formas de violência contra os próprios filhos teriam induzido ou incitado o outro genitor a formular denúncias falsas ou temerárias.
Desta forma, o suposto abusador manipularia o sistema de modo a obter o duplo benefício, com a facilitação do acesso à vítima e o afastamento do protetor, em alguns casos obtendo inclusive a inversão da guarda em seu favor.
Ou seja, a CPI descobriu que, num evidente contrassenso, em alguns casos a Lei de Alienação Parental pode estar sendo utilizada para o fim que ela mesma proíbe, que é apresentar falsa denúncia contra genitor.
Isto estaria ocorrendo pelo fato de que os artigos 4º e 6º da Lei da Alienação Parental, preveem que bastam meros indícios da prática de atos típicos de alienação parental para a imposição de alguma medida liminar contra o suposto alienador.
A Lei da Alienação Parental, de fato, permite ao juiz, após ouvir o Ministério Público, decretar as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente.
No entanto, diversas mães de crianças e adolescentes declararam ter inclusive perdido a guarda dos filhos para pais maltratantes, especialmente após relatarem às autoridades suas suspeitas de maus tratos.
Ocorre que a Lei prevê especificamente a apresentação de falsa denúncia criminal perante a autoridade policial como uma forma exemplificativa de alienação parental.
Diante deste tipo de situação, em tese, o juiz pode determinar até mesmo a alteração provisória da guarda, para assegurar sua convivência com genitor, na medida em que não comprovada eventual denuncia de maus tratos.
Diante dos relatos de mau uso da Lei, os membros da CPI chegaram a aprovar no relatório final a apresentação de uma proposta legislativa no sentido da revogação da Lei da Alienação Parental.
Evidentemente que, para enfrentar esse problema, revela-se exagerada a decisão de revogar a Lei na sua totalidade.
Mas, sem dúvida, é importante identificar e corrigir as brechas que possibilitam o uso impróprio das medidas nela previstas, e impor sanções a quem praticar esse tipo de conduta.
Por esta razão, está tramitando no Senado uma emenda substitutiva ao projeto que decretava a revogação, no sentido do aperfeiçoamento da lei da Alienação Parental, em razão da exploração de falhas existentes em alguns de seus instrumentos.
Isto porque, o simples descarte da lei inteira daria plena liberdade de ação para os alienadores, em desfavor dos alienados e, principalmente, em prejuízo das crianças e dos adolescentes, violando o direito à convivência familiar.
Estre as mudanças propostas, está a inclusão de dispositivos prevendo a aplicação de modo gradativo visando à conscientização do alienador e à construção do respeito de todos ao direito ao convívio familiar, em prol da criança ou do adolescente.
Na realidade, esta tem sido a prática na maior parte das denúncias de Alienação Parental.
Ainda está sendo proposta alteração da lei no sentido de que nos casos de denúncia de abuso ou violência sejam adotadas efetivas medidas para prevenir a exposição da criança ou do adolescente a qualquer forma de violência, abuso ou negligência por parte do genitor denunciado.
Assim a seguinte emenda substitutiva do Projeto de Lei do Senado nº 498, de 2018, propõe, em síntese, a alteração de dispositivos contidos nos artigos 2º, 4º, 6º e 7º da Lei da Alienação Parental, e a inclusão do Artigo 6-A.
Pela nova proposta, a falsa acusação de alienação parental, apresentada com o intuito de facilitar a prática de delito contra a criança ou o adolescente, passa a ser crime punido com a pena de Reclusão de 2 a 6 anos e multa, sendo a pena aumentada de um a dois terços se o crime for consumado.
Neste sentido, é importante que não haja retrocessos, e que possamos avançar na proteção dos direitos de nossas crianças e adolescentes, tanto no sentido da proteção contra abusos e maus-tratos, quanto na preservação dos vínculos afetivos e do convívio familiar.